domingo, 30 de agosto de 2015

Ainda somos os mesmos e vivemos, Elis???

Eu cresci ouvindo as músicas da Elis Regina, graças ao bom gosto dos meus pais. Segue abaixo um texto que li em um Sarau Cultural em homenagem a essa grande cantora, onde usei uma das músicas que mais gosto, “Como os nossos pais”, e fiz uma “mistureba” de ideias. Aí vai:

Não quero lhe falar meu grande amor, de coisas que aprendi nos discos e nos livros, porque os discos arranham e os livros omitem. Escondem a história de luta do povo oprimido e vangloriam a versão do vencedor.  Vencedor este, de uma vitória desleal, que mostra que nem sempre o bem vence no final. Quero lhe contar como eu vivi e tudo o que aconteceu comigo. Cresci sendo xingado de viado, Os negros, de macaco. As meninas, de fácil. Os pobres, de favelado. Os deficientes, de retardado.  

Viver é melhor que sonhar. Mas se não é o sonho, como é que vou respirar? Me diz, como é que eu vou aguentar? A vida vem leve como um soco no estômago que parece que nunca vai acabar. Mas eu sei que o amor é uma coisa boa. Mas também sei que qualquer canto é menor do que a vida de QUALQUER pessoa. Porque se não temos dinheiro e status, somos tratados como um qualquer. Mas são os conjuntos de quaisquer que faz a vida andar pra frente, prontos pro que der e vier. 

Por isso cuidado meu bem, há perigo na esquina. As esquinas que ficam as travestis, vítimas de uma sociedade que não abraça quem é diferente e que quer só ser feliz. As esquinas escondidas dentro de nós, que insistem em não mudar, em não atravessar pra outra calçada, em não virar a rua e dar um novo rumo pra todo o tipo de intolerância. Eles venceram e o sinal está fechado pra nós que somos jovens. Porque o poder parece que venceu: veste terno, fala palavras bonitas, joga frases de efeito mas se suja só por causa de dinheiro. Dinheiro da saúde, da educação, da cultura, da creche, da merenda, da luta, do suor, do sangue meu e seu. E se o sinal está vermelho pra quem luta, então que sejamos daltônicos, ou vai continuar sendo um simples anônimo? 

Pra abraçar seu irmão e beijar sua menina, na rua. É que se fez o seu braço, o seu lábio e a sua voz. Braço pra lutar, lábio pra argumentar e a voz pra gritar. Lutar pelas injustiças que insistem em matar. Argumentar contra o que a mídia e o senso comum insistem em internalizar. Gritar pra que qualquer tipo de opressão não possa dominar. 

Já faz tempo eu vi você na rua. Cabelo ao vento, gente jovem reunida. Porque a rua é espaço pra quem está indignado... mas CUIDADO!!! Cuidado pra não ser só mais um capacho. Que a sua luta não seja usado por partidos mal intencionados. Que o seu ideal seja revolucionário. Na parede da memória, esta lembrança é o quadro que dói mais. Sabe porque dói? Porque distorceram nossas lembranças e nossa história. Penduram na sala principal, um quadro da família tradicional brasileira, como se isso nos representasse. Nos empurram goela abaixo um Deus Branco, que prega amor mas condena os gays, é bondoso mas criou o inferno pra quem sai da linha. PARA!!! Para e pensa, o mundo pedindo SOCORRO e ainda somos obrigados a escutar discursos morais preconceituosos enfeitados de amor e bem querer? A gente não é burro. 

Minha dor é perceber que apesar de termos feito tudo o que fizemos, ainda somos os mesmos. Será que fizemos tudo, o bastante? Será que nossos atos refletem as nossas palavras? E será mesmo que ainda somos os mesmos? Assim como não dá pra entrar no mesmo rio duas vezes porque ele nunca vai ser o mesmo, porque esta em constante transformação, então que sejamos como os rios de águas cristalinas, não nos deixando poluir com a injustiça, a ganância e a hipocrisia. Só assim, não seremos os mesmos e não viveremos como os nossos pais. Seremos e viveremos bem melhores. 


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